conjunto vazio

  Em tudo o cheio faz o visível da estrutura, mas o vazio estrutura o uso.1

(trata-se de um projeto2 no qual são utilizados elementos visuais que contêm ou dão ênfase a diferentes noções de vazio, e, sobretudo, à noção de conjunto integrando essas várias abordagens e a ressonância de seus significados.
Mais do que a uma instalação propriamente dita, talvez o mais correto seja nos referirmos à idéia de apresentação e montagem)

Mas:
Como escrever sobre uma exposição que não é visível ainda?
Como escrever sobre uma exposição que só se constitui enquanto montagem, enquanto relação entre componentes, enquanto relação ao espaço dado?
Como escrever sobre o que ainda é processo de criação, mas que não acaba, estando a exposição montada, e certamente continua depois?

) toda exposição coloca o problema da apresentação. Esta é sua constituição mesmo.
Meu esforço se concentra naquilo que prepara para o visível.
Mas o que seria uma escritura de apresentação?
O que pode a escritura a favor do visível? (

A dificuldade de escrever. A dificuldade que também se deve aos aspectos intrínsecos a essa exposição mesmo, ao tipo de proposição e de visualidade em jogo.

(... então voltar a zona inicial ...utilizar um texto como entrada, como saída, como um vai-e-vem de fluidos criando a indefinição de uma orla... então usar o texto como vidro, como celofane transparente, seguir o fluxo diáfano da água, escorrer o olhar por dentro de seu volume... usar o texto como lâmina invisível, surgir pela abertura, pelo olhar que atravessa e não encontra anteparo, usar o texto como um travesseiro cristalino (sonhar: o deserto... o desejo), usar o texto como travessia na espessura atmosférica, no espaço desse dia que inclina suas luzes e despeja suas obliqüidades na sala, usar o texto com toda a relatividade da noção de vazio, usar um texto branco, um texto em branco, usar um texto incolor, usar um texto...)

...o interior da xícara, o espaço entre dois edifícios, seu recorte em negativo contra o céu, aquilo que não é forma, mas que nos espreita, o espaço entre duas mãos, entre quatro mãos, esse espaço acima delas, embaixo, a sua frente, numa extensão heterogênea e não-contínua, o espaço debaixo da mesa, os objetos desabitados, os que talvez nunca serão habitados...

) economia de consumo de vazios. Poros (

(a pontuação é uma espécie de separador sintático. A pontuação organiza uma seqüência (o que vem antes, o que vem depois), uma seqüência de eventos, de apresentações. Ela cria espaçamentos. Sua ênfase aqui, é no sentido de um encadeamento intervalar. A pontuação instaura intervalos na seqüência de operações sobre a forma e a visualidade)

A arte como simples apresentação da apresentação, designação vazia:
o salto no trampolim, a queda no (in)visível

Helio Fervenza
1998


Notas:
1. CHENG, François. Vide et Plein - Le langage pictural chinois. Paris : Seuil, 1988. p.30.
2. Este texto foi escrito em abril de 1998 para acompanhar e apresentar duas exposições individuais intituladas Conjunto Vazio realizadas nesse mesmo ano, primeiramente no Memorial de Curitiba / Fundação Cultural de Curitiba e depois na Galeria Iberê Camargo, SMC, Porto Alegre. O texto foi publicado em agosto do mesmo ano em Motim – Site Cultural, Edição N° 2, Porto Alegre. Posteriormente foi também publicado no livro O + é deserto, Editora Escrituras, São Paulo, 2003.